segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

A Saga de Paulinho Láparo, o Magro - Capítulo III

Toda segunda-feira, um novo capítulo. 

Capítulo 3 - Cinzas do passado.

Três semanas! Três semanas se passaram e Paulinho Láparo, o Magro, ainda se sentia raivoso com a indiferença de Mestre Kire Dahin e triste com a sua reação, aquela explosão de raiva, imprópria para seus arraigados princípios morais. Sobretudo, era um homem de paz! Lembrou as palavras de Go Calan, o agiota, capaz de aniquilar com as próprias mãos um inadimplente, com o mais belo dos seus sorrisos nos lábios:
- Magro, a raiva é capaz de envenenar a sua alma e matá-lo. Portanto, use-a na direção contrária e deixe-a matar quem estiver à sua frente, principalmente um oponente ou devedor.
Láparo não concordava sequer com uma palavra do que dissera Go Calan, mas calou-se. Tinha ido até ele para pedir, mais uma vez, prazo para o pagamento de sua dívida. E Go Calan estava sorrindo. Voltou pensando naquelas economias de sua mãe. Sabia onde estavam escondidas. Láparo não gostava da ira de Go Calan, como repudiou a própria raiva. Mas a minha resposta? Cobrou-se Paulinho Láparo, o Magro, corroído pela dúvida atroz.
Tem que haver outro mestre. E tinha. Mestre Flam Boyant, o Seco-Florido. Como não pensei nele antes?
Três dias de caminhada, Paulinho Láparo, o Magro, exaurido, já pode ouvir mestre Flam Boyant:
- A frase é de Pablo Picasso, denominado assim pelos companheiros das saunas da quinta-feira: “Deus é um artista. Ele inventou a girafa, o elefante, a formiga. Na verdade, Ele nunca procurou seguir um estilo – simplesmente foi fazendo tudo aquilo que tinha vontade de fazer.”
E prossegue mestre Flam Boyant, o Seco-Florido:
- Quem disse que temos que fazer tudo certinho? Vamos resgatar nosso direito de ser medíocres. Deus, você e eu podemos errar. Deus errou, Ele também fez uma tremenda porcaria. Não fez? Hem? Não fez? Querem ver que fez? Olhem aquele que acaba de atravessar a porta deste templo da humildade: Neném Cabecinha! A prova de uma lambança de Deus.
Paulinho Láparo, o Magro, sentiu mil facas trespassarem seu corpo. Aqueles olhos eram aço de punhal, mas incapazes de vazar sua indignação:
- Neném Cabecinha é a puta que te pariu!
Ah! O silêncio mortal nunca foi tão silêncio, nunca foi tão pesado. Jamais, ali naquele templo da humildade de mestre Flam Boyant, o Seco-Florido, o silêncio fora tão açoite.
Láparo andejou errante, arrastando os pés. Fome, sede e vergonha. E dor! Dos lanhos do látego, dez chibatadas nas costas desnudas e em público? Não! Por ter ofendido o mestre? Não, nunca! Neném Cabecinha... Filho da puta! Quem era o mestre, na verdade? Ele o conhecia. De onde?
Quando começamos a percorrer nosso caminho, um grande pavor nos acontece. Mas ali não era pavor, era exaustão. Paulinho Láparo, o Magro, tateou seus passos e venceu a distância que havia. Às margens do rio das pedras, ele sentou-se e chorou. 

2 comentários:

  1. Cada um , melhor que o outro. Aos poucos o Brasil vai conhecendo um grande escritor e mais que isso, um grande criador.Bote tudo pra fora, o mundo te espera. Sucesso. Clayton Aguiar.

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  2. Grande Eto!
    Tem somente 33 anos que não nos vemos, daí achar que você não vai lembrar mas, sou Jorge Modesto, amigo/irmão de Marcelo Aguiar.
    Parabéns pelo blog. Mais um "Lapariando".
    Abraço.

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