domingo, 6 de fevereiro de 2011

A Saga de Paulinho Láparo, o Magro - Capítulo V

Toda segunda-feira, um novo capítulo

Capítulo 5 - O mergulho

Uma grande pergunta e algumas questões de variada importância dominavam sua existência. Transformaram-no em adicto. Não sabia viver sem elas, começar o dia sem pensar nas suas indagações, ou mesmo escapar de sua angústia. Vivia por uma busca. Queria respostas. Por si só, não as encontrava. Andava a esmo garimpando mestres. Padres e pastores, nem pensar! No momento não tinha indicação do nome de nenhum mestre a quem consultar. Em contrapartida, sua angústia crescera muito nos últimos dias. Temia por revelar-se insano. Sabia que insanidade é repetir as coisas e esperar resultados diferentes. Fazer tudo igual era o que fazia. É bem verdade que o redivivo Neném Cabecinha, qual fênix ressurgindo das cinzas da sua memória, agravara ainda mais as agruras da sua vida. E naquele momento ele não se sentia pronto para encarar o passado.
Paulinho Láparo, o Magro, somente veio a si tangido pelo raspado de garganta que antecipa a fala de alguém quedado em silêncio por longas horas. Poderia ter sido o próprio Paulinho, mas não foi. A seu lado estava um homem e ambos sobre a ponte do riacho.
- O que se passa? – Indagou o homem.
Paulinho Láparo, o Magro, tinha na mão uma laranja. Atira a laranja na água e diz:
- Vê!
A laranja afunda na água esverdeada e reaparece alguns metros adiante, boiando. Depois, é levada pela correnteza. O Magro volta a falar:
- Deveria ser assim comigo. Juntar tudo o que me aflige, atirar na água e depois seguir em paz.
- Por que não o faz?
- Soube com a laranja, não sei fazer da forma de que preciso.
- Simplifica.
- Como?
- Deixe seus problemas na ponte, pule você na água e se entregue à corrente.
Paulinho olhou surpreso para o homem. Este, sorrindo, estendeu-lhe a mão:
- De Ran... Muito prazer.
- Paulinho Láparo, o Magro. Obrigado. Também sinto prazer em conhecê-lo.
Sacudiu a mão do homem.
- É francês?
- Não. Nem descendente sou. Quando criança, era tão feio que meus amigos e os meninos da redondeza me chamavam de Cu de Rã. Adulto, tornei-me jogador de futebol profissional. Obtive certo sucesso e, quando a imprensa começou a me procurar, se esbarrou na inconveniência do meu nome. Sugeriram De Ran. Achei bonito e ficou. Tinha muitos sonhos, mas na frente havia um beque... Sempre há um beque no caminho... Quebrou meu joelho. E então, vai pular ou não?
- Estou com medo.
- Como disse o poeta Fellipe Vaz, filho de menestrel e neto de notório desconhecido: “Corajoso é aquele que teme, pois nos dias incertos tem o que superar.”
Paulinho espalmou as duas mãos sobre o rosto. Respirou fundo, prendeu a respiração por alguns segundos. Soltou o ar bem devagar. Baixou as mãos e abriu os olhos. Apenas ele estava sobre a ponte. O Magro nem se preocupou em procurar De Ran com os olhos: ”Quando se trata de pessoas, você pode ter certeza absoluta apenas sobre uma coisa: elas normalmente vão embora.”
Abriu os braços e saltou da ponte. Era apenas uma laranja entregue à correnteza.

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